Não sou "de missa", mas às vezes apetece-me ir à Igreja. Claro que não me serve uma qualquer: vou ao Campo Grande, porque ouvir o padre Feytor Pinto é um privilégio. Sentimo-nos numa aula, com um professor excepcional, que nos ensina sempre alguma coisa. O que ele consegue "tirar" dos textos que são lidos na missa é espantoso. E, no domingo passado, mais uma vez a minha expectativa não foi defraudada.
A propósito das tentações de Cristo pelo demónio, quando estava no deserto, e depois de passado a pente fino todo o texto, o padre Feytor Pinto demonstrou que as tentações deste mundo, que nos parecem muitas, se resumem a três (!): o Ter, o Poder e o Prazer. Tão simples! E como ele exemplificou bem estas tentações no mundo contemporâneo: o Ter - todos procuram ganhar o máximo, ter mais dinheiro que o vizinho, mostrar a sua capacidade económica, não olhando a meios para atingir este fim. As pessoas escollhem o caminho mais fácil, o que dá menos trabalho. E, se for preciso, metem uma cunha a alguém, para lhes facilitar o caminho. O Poder - nem é preciso falar no poder político, no autárquico. O exercício do poder encontra-se no dia a dia, nas relações familiares, no emprego, até nos grupos de amigos: quem manda em casa? Os filhos mandam nos pais? O chefe manda nos subordinados? Quem é o mentor do grupo? Finalmente, o Prazer - vivemos na era do imediatismo. O prazer é para já, temos que o encontrar a qualquer preço, deixámos de ter tempo para esperar por algo que nos dê prazer, tem que ser JÁ! E como os nossos jovens são bem o símbolo desta época...
Continuando: O mundo contemporâneo é um deserto (a ligação ao tempo que Cristo passou no deserto e onde foi sujeito às tentações, às quais resistiu, claro, ou não fosse ele o Filho de Deus): cada vez mais árido, no sentido literal, por obra do Homem, que vai destruindo tudo sem pensar nas consequências, senhor do seu imenso egoísmo (basta pensar no protocolo de Quioto e no seu incumprimento pelo país que mais polui, leia-se EUA); e no sentido figurado - neste deserto físico a solidão espalha-se, alastra qual mancha de óleo, sem obstáculos que a detenham. Temos cada vez mais gente só, que pensa encontar companhia mergulhando no tal prazer imediato. Quando a festa acaba, a solidão é maior ainda...E aumenta a falta de capacidade de amar. As pessoas tornaram-se egoístas: envolvem-se nas causas humanitárias, muitas vezes só para ficarem de bem com a sua consciência, para não se sentirem incomodadas. Não custa ajudar o Banco Alimentar Contra a Fome, porque os que têm fome não estão à nossa porta. Mas somos capazes de ter gente com fome de amor e de atenção bem perto de nós, e nem damos por isso.
Diz o padre Feytor Pinto que ser bom cristão não é ir à missa todos os domingos e comungar. Claro que não. Ser bom cristão é ser capaz de dar sem esperar receber nada em troca, ter atenção ao outro, estar disponível, ser honesto e leal, pensar mais nos outros que em nós (o jejum quaresmal passa por aqui, e não pela privação de comida...)
Vamos tentar inverter a desertificação deste nosso mundo dando um pouco de nós?